Academia novinha, inaugurada havia poucos meses, quase todos os profissionais recém-contratados, exceção feita aos coordenadores e outras poucas pessoas que vinham de outras unidades.
Nas reuniões técnicas era pedido constantemente que os professores vestissem a camisa da academia, que não se limitassem à ministrar a aula, mas que olhassem de forma global, que ajudassem a tornar a experiência dos clientes mais agradável. Ela, atendendo ao pedido estava constantemente se colocando à disposição para colaborar, sem sacrifício, era da sua natureza ser assim. Além disso ajudava a coordenadora, de quem ficara amiga, sempre que solicitada. A moça era jovem, inexperiente no cargo, o trabalho era árduo e as cobranças grandes.
Vestindo a camisa da empresa, como fora pedido, levou folders para para entregar aos conhecidos e vizinhos, já que morava nas proximidades, era ativa na comunidade das redes sociais. Vestindo a camisa da empresa indicou a academia para servir de locação para matérias de fitness na revista que dava consultoria, mais de uma vez.
Seguia ministrando suas aulas, a academia crescendo cada vez mais, dava gosto de ver aquele mundo de gente circulando nos corredores e as aulas cheias, tinha orgulho de trabalhar naquele lugar. Lembra-se com pesar da notícia da saída do coordenador geral, que era quem fazia as coisas funcionarem, e da preocupação de que as coisas desandassem, o cara era realmente bom, vestia a camisa da empresa, um exemplo.
Pouco tempo depois outra notícia ruim, sua amiga coordenadora, também estava pulando fora. Deu uma desculpa aos gestores, para não fechar as portas, arrumou a casa. Passou algumas aulas que ministrava para ela, que interpretou como sinal de gratidão e confiança, pois podia ter feito isso, para qualquer outro professor. Ela sabia a verdade, prometeu manter segredo e assim o fez. Não ia queimar amiga.
Certo dia foi chamada à sala da direção, perguntaram o que tinha achado do novo site da academia. Ela nem tinha tomado conhecimento que já estava no ar e não hesitou em dizer. Os professores não foram avisados do site, o que parecia ser esperado pelos diretores. É, alguém não estava vestindo a camisa da empresa.
A pedido da diretora, ela acessou o site, quando chegou em casa, e percebeu que haviam alguns problemas. Vários links não funcionavam ou direcionavam para a página errada e haviam descrições de aulas trocadas. A lista era grande preparou um e-mail e enviou para diretora, estava longe da sua obrigação, ela sabia, mas munida de boa vontade, fez assim mesmo.
Passado alguns dias ela foi chamada pelo ex-coordenador geral e por sua amiga coordenadora, já nos últimos dias do aviso prévio, para conversar em uma das salas de aula. Em um primeiro momento chegou a pensar que seria convidada por eles, para trabalhar junto no novo projeto que tinham (esse era o segredo!!!), mas logo percebeu que o ambiente estava pesado demais para um convite.
De forma extremamente agressiva foi questionada sobre o tal e-mail, sofreu todo tipo de acusação e ameaças, pois estava passando sobre a autoridade do dois. E ela só pensava: como assim? Que autoridade? Ele não saiu? Ela não está saindo? Não foi a diretora que pediu pessoalmente para olhar o site? E o papo de vestir a camisa da empresa, ir além, melhorar a experiência do cliente, repetida como uma lavagem cerebral por ambos nas reuniões?
Ela explicou que a atitude foi fruto de um pedido pessoal, educadamente pediu desculpas e agradeceu por terem “explicado melhor” como as coisas deveriam acontecer. No fundo pensava: desculpem, por vestir a camisa da empresa, desculpem a diretora por me fazer um pedido pessoalmente, desculpem por não reconhecê-los mais como líderes e obrigada por mostrarem quem realmente são, ainda que tardiamente.
Essa não foi a primeira decepção e tão pouco foi a última, aos poucos foi deixando de lado a camisa (de força) da academia, sempre com pesar, sempre pensando como as coisas poderiam acontecer de outra forma, sempre percebendo que apesar do discurso, o que menos importava naquele lugar eram as relações humanas. Com o tempo entendeu a posição daqueles cujo trabalho admirava e de quem chegou a pensar ser amiga. A sensação que ficara de ambos, era única: pena.
Aos poucos foi deixando a camisa (de força) da academia, até se libertar totalmente e , feliz, não vesti-la mais.
Publicado originalmente em 24/06/2013
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