Para alguns a resposta pode parecer óbvia, prescrever suplementos alimentares é função de nutricionista ou médico, mas o que acontece na prática é que as pessoas parecem não saber. Digo isso pois é muito comum encontrar Profissionais de Educação Física fazendo prescrição de dietas e suplementos, isso ocorre porque há uma demanda por esse tipo de serviço e os Educadores Físicos vêem aí mais uma fonte de renda, sem se preocupar com a ética profissional. Já comentei sobre o assunto no post Economize: fuja dos professores que prescrevem suplementos, conheço inúmeros professores que fazem prescrição e muitas vezes sou duramente criticada por leitores quando não indico o quê, e quanto tomar e sugiro que busquem a ajuda de um Nutricionista, basta olhar os comentários postados por aqui no Fique Informa.
A prova cabal de que não estou exagerando no que digo veio com uma matéria publicada pelo site Portal da Educação Física na quarta-feira (23). No texto um publieditorial, patrocinado por uma empresa de suplementos, intitulado Professores investem no atendimento e na consultoria para se diferenciar e aumentar a renda, um professor se gaba de ter se tornado um consultor dessa empresa, após realizar um treinamento e que assim oferece consultoria especializada aos clientes e garante uma “boa renda extra”. O que agrava a situação é o fato da divulgação patrocinada, ser feita por um site super conceituado, referência na área da Educação Física, apesar de ter recebido uma mensagem privada no Twitter afirmando que o canal de notícias é para estimular discussões e não reflete a opinião do mesmo. Sem contar que a iniciativa é apoiada por vários nomes conceituados na área que não cabem serem citados aqui, mas que poderão ser facilmente identificados no artigo e no site da empresa.
Suplementos, venda livre
Suplementos, desde que liberados pela ANVISA, podem ser comercializados livremente, sem necessidade de receita, em farmácias, lojas especializadas, supermercados, sites etc. Ficam na prateleira, basta passar por lá, pegar e consumir. Legalmente um Profissional de Educação Física, assim como qualquer outra pessoa, pode abrir uma loja de suplementos e vendê-los.
Quem vende suplementos fatalmente terá que responder à perguntas sobre o que é melhor, como, quando e quanto consumir, mas aí esbarra em uma questão ética, pois ao passar essas informações está fazendo prescrição e isso cabe ao Nutricionista ou Médico. Um Profissional de Educação Física, pode, por exemplo, explicar para que servem os suplementos, o que fazem pelo corpo da pessoa, indicar onde comprar com bom preço e indicar marcas confiáveis.
Prescrição de suplementos, uma questão de ética
O nome suplemento alimentar já diz tudo, serve como forma de suprir uma necessidade específica cuja alimentação não está dando conta. É comum, por exemplo, pessoas com falta de vitaminas ou ferro, tomarem suplementos que contém essas substâncias sob a orientação médica. Nesses casos é relativamente fácil para o médico fazer a prescrição, pois exames complementares indicam a deficiência dessas substâncias.
Aqui tratamos de um outro tipo de suplementação, a esportiva. São indivíduos saudáveis, com um gasto energético alto, que procuram melhorar a performance e que buscam esse tipo de suplemento. Sabemos também que na maioria das vezes basta uma boa alimentação para suprir essa necessidade.
Para quantificar essa necessidade, que é individual, não bastam exames, é preciso ter um conhecimento profundo sobre alimentação e o profissional que estudou para isso é o Nutricionista. São inúmeras as variáveis gênero, idade, estilo de vida, hábitos alimentares, nível de atividade, problemas de saúde, horas de sono etc, sendo assim dá para acreditar que alguém que não tenha essa formação estará apto para fazer a prescrição?
O Profissional de Educação Física, estuda nutrição, o suficiente para dar uma orientação básica, que qualquer outro profissional da saúde poderia dar, mas não para prescrever dietas e suplementação. Quando prescreve o suplemento o Profissional de Educação Física, fere a ética a medida que a Lei Nº 9.696, de 1 de setembro de 1998, que regulamenta a profissão diz em seu artigo 3º:
Compete ao Profissional de Educação Física coordenar, planejar, programar, supervisionar, dinamizar, dirigir, organizar, avaliar e executar trabalhos, programas, planos e projetos, bem como prestar serviços de auditoria, consultoria e assessoria, realizar treinamentos especializados, participar de equipes multidisciplinares e interdisciplinares e elaborar informes técnicos, científicos e pedagógicos, todos nas áreas de atividades físicas e do desporto.
Em momento algum fala em alimentação, dieta ou suplementação. Já o artigo 4º da Lei 8234, de 17 de setembro de 1991, que regulamenta a profissão de Nutricionista diz:
Atribuem-se, também, aos nutricionistas as seguintes atividades, desde que relacionadas com alimentação e nutrição humanas:
…VII – prescrição de suplementos nutricionais, necessários à complementação da dieta;
O que fazer para mudar esse quadro?
Vejo quatro frentes de ação.
- Ética se aprende, então dar ênfase às essas questões no momento da formação profissional é o primeiro passo.
- Ser ético, praticar a ética, vem de berço. É uma questão de princípios. Aí entra a fiscalização, que deve ser feita pelos conselhos, não apenas o de Educação Física CREF/CONFEF como o de Nutrição CFN/CRN. A medida que os profissionais forem punidos pelo exercício ilegal da profissão, outros pensarão duas vezes antes de fazê-lo.
- Orientar a população sobre as atribuições de cada profissional através de campanhas educativas.
- Fomentar o trabalho multidisciplinar criando mecanismos que facilitem a aproximação dos dois profissionais, como um banco de dados on-line, por exemplo.
O que é preciso ficar claro é que Profissionais de Educação Física prescrevem exercícios e não dietas ou suplementos, isso é prerrogativa dos Nutricionistas, preferencialmente daqueles que se especializaram em Nutrição Esportiva. Se um profissional de Educação Física quiser prescrever os suplementos que faça um curso de Nutrição, mas fique atento pode não ser bom o suficiente nem em uma área, nem na outra.