Volta e meia esse assunto vem a tona, por que só o Profissional de Educação Física pode prescrever exercício? A resposta pode parecer óbvia, mas está sempre em cheque. São médicos que tentam se apropriar desta função (e de outras!), através do Ato Médico, fisioterapeutas que ao invés de se concentrarem na reabilitação querem prescrever treinamento e agora eis que surge uma nova formação o Técnico de Esportes e Atividade Física.
A matéria publicada no Emagrece Brasil, página da Saúde Abril, sobre esse curso técnico, causou uma grande mobilização e revolta de Profissionais de Educação Física nas redes sociais e trouxe à tona várias questões.
A justificativa para a criação do curso é que existe uma dificuldade em levar modalidades esportivas que não o futebol para “comunidades” somada à falta de qualificação de muitos jovens. Esse curso técnico está sendo ministrado no Centro Técnico Paula Souza, em São Paulo, e segundo sua coordenadora “Há uma necessidade de profissionais que ensinem e disseminem esportes que não consegue ser preenchida só por quem se formou em educação física na universidade”.
O que tem aparecido nas discussões sobre o tema nas redes sociais como o que foi defendido pela atleta Ana Moser é que a quantidade de Profissionais de Educação Física é insuficiente para atender toda a demanda e que nos lugares mais distantes existe a falta desses profissionais, os técnicos serviriam como auxiliares, além disso trata-se de uma prática comum em países como Estados Unidos e França, o que é absolutamente verdade, mas não pode ser aplicado aqui.
Técnico de Esporte e Atividade Física não tem espaço na estrutura atual
O curso técnico ligado à área de Educação Física não é uma novidade, existiu anos atrás e foi extinto juntamente com outros cursos técnicos. A diferença que temos hoje é que a profissão Educação Física está regulamentada e não há espaço para a atuação desse técnico, não só do ponto de vista prático, mas também do ponto de vista legal (Lei 9.696).
A ideia seria fazer como acontece na França conforme mostra a matéria publicada pelo Centro Paula Souza sobre Colóquio Internacional de Esporte realizado no dia 27 de março. Lá o técnico existe graças aos esforços dos sindicatos dos instrutores de esqui e natação, compreensível e totalmente fora da nossa realidade. No Brasil não temos mais instrutores, temos Profissionais Provisionados (que com o tempo deixarão de existir) e Profissionais Graduados, estamos à frente da França e de muitos outros países.
A função do técnico seria bem vinda, principalmente para auxiliar àqueles profissionais que trabalham com grandes grupos, mas dentro da estrutura que temos hoje essa função é feita e só poderá ser feita pelo estagiário de graduação ou claro, por outro profissional da área.
Se já temos a figura do estagiário para auxiliar o profissional, qual seria a função desse técnico? Mesmo pensando na diminuição de custos um estagiário é mais barato do que seria o técnico, que segundo a matéria publicada no Emagrece Brasil, ganharia cerca de três salários mínimos, mais do que muito Profissional de Educação Física.
O que estaria por trás desse interesse na criação do curso técnico de Esporte e Atividade Física?
Já expliquei que na estrutura atual não temos espaço para a atuação do técnico.
Afirmar que existe uma carência de profissionais de Educação Física, não é verdade. Em 2011 existiam 381 cursos de Educação Física no Brasil, só de bacharelado, que formaram cerca de 14 mil profissionais, só naquele ano!
Dizer que o Brasil é enorme e há regiões onde faltam profissionais, isso já sabemos e faltam profissionais de diversas áreas, mas não será criando um curso técnico em São Paulo que irá melhorar.
Formar mão de obra barata e permanente que atenda à interesses específicos? Acredito que a resposta vá por esse caminho. Primeiro formam-se técnicos, depois modifica-se a lei, já que para formá-los houve gasto de dinheiro público. Como é sabido o salário de técnico é menor do que o profissional e isso é relevante principalmente na hora de realizar concursos. Feito isso coloca-se esses técnicos para “orientar outras pessoas a realizar um exercício físico de maneira segura e lúdica”. Lúdica pode ser, mas segura???
Por que só o Profissional de Educação Física pode prescrever exercício?
Todo exercício físico causa mudanças agudas no corpo humano e crônicas também. Quando bem orientadas as mudanças afetam as pessoas de forma positiva quando mal orientadas pode levar a lesões e até à morte.
O exercício físico causa alterações nos batimentos cardíacos, na pressão arterial, na secreção hormonal, em ossos, músculos e articulações de forma diferente para cada fase da vida e dependendo do gênero (sexo) do indivíduo. Para entender como essas alterações acontecem e como se beneficiar delas é preciso estudar muito disciplinas como anatomia, fisiologia, bioquímica, biomecânica dentre outras tantas disciplinas incluindo aquelas que ensinam como ocorre a aprendizagem em diversas fases da vida. O que ocorre em cursos de formação superior em Educação Física ao contrário do que seria um curso técnico que segundo Elaine Piccino, coordenadora de projetos do Centro Paula Souza, “É uma formação generalista, que possibilita ao profissional desenvolver atividades iniciais para todas as idades” em matéria publicada no site da própria instituição. Além disso esse curso técnico que já conta com uma turma piloto acontece na ETEC de Artes. Como assim? Esporte e Atividade Física estão ligados à Área da Saúde!
É fato que temos péssimas instituições de ensino superior por aí, em todas as áreas, é fato também que o Centro Paula Souza, prima pela excelência em seus cursos, mas não podemos achar que prescrever exercício é tão simples que pode ser feito por um técnico. Por exemplo, você sabe o que uma atividade mal orientada pode causar à uma criança? A resposta provavelmente será “problemas no crescimento”, antes fosse só isso, pode causar deformações que a criança levará para o resto da vida. Responda então: você faria uma cirurgia com um técnico em medicina que estudou 2 anos só porque trata-se de um procedimento mais simples?
Se você preza pela manutenção da sua saúde e bem estar, diga sim à atividade física orientada por Profissionais de Educação Física.
Se há falta de Profissionais de Educação Física para prescrever exercícios há também falta de médicos nos postos de saúde e hospitais, ou tem alguém que ainda não percebeu por quanto tempo se fica sentado ou em pé mesmo esperando nos postos de saúde ou até em renomados hospitais pra ser atendido, salvo se você é alguém que tem muito dinheiro para ser super bem atendido. Nesse caso qualquer área se destaca, seja médico ou de Educação Física, se o cliente ou paciente tem dinheiro todo atendimento torna-se mais rápido. Quem acompanha os noticiários sabe que os médicos frequentemente estão ausentes dos postos de saúde por razões obscuramente explicadas.
Oi Dirson,
É verdade, mas nem por isso vamos criar um curso técnico de medicina para suprir essa falta, né?!
Na realidade não faltam profissionais, faltam políticas públicas que possibilitem que os profissionais existentes sejam mais bem distribuídos e recebam salários condizentes com suas funções.
Abraços
Profa. Esp. Denise Carceroni