Com uma provocação feita através do Twitter o CONFEF (Conselho Federal de Educação Física) questiona: E aí? Concorda? “Malhação online coloca saúde da população em risco” referindo-se à um texto publicado no dia 08 no R7 Notícias.
No texto o profissional de Educação Física Luigi Guimarães se diz impressionado com as orientações disponíveis na internet após um estudo em que analisou 15 programas virtuais de exercícios, encontrando inúmeros absurdos.
Respondendo ao CONFEF: Eu discordo! E explico por quê…
Que existem programas de exercícios muito ruins na internet, não tenho dúvidas. E mais, tenho certeza que vai bem além dos 15 estudados pelo professor, sem contar as informações fragmentadas, mas daí a afirmar que malhação online coloca a saúde da população em risco, existe uma enorme distância.
Luigi aponta que o maior problema identificado é a falta de orientações específicas. O professor de musculação Wallace Dias vai além e diz que “a internet não respeita o princípio de individualidade, e a atividade física se torna um risco à saúde sem o acompanhamento adequado. Ele explica que o professor tem papel fundamental: “aponta os exercícios ideais para o objetivo do aluno, sem que a pessoa desenvolva problemas na postura, nas articulações ou até cardíacos?.”
Educação Física não é individual, é coletiva
Afirmar que a saúde nas atividades físicas anda de mãos dadas com a individualidade é pensar na Educação Física de forma linear. É olhar apenas para um aspecto, a teoria do treinamento, e concluir que só haverá ganho para saúde se seus princípios forem respeitados. A Educação Física é muito mais abrangente do que isso, permeia muitas áreas do conhecimento. Educação Física não é feita sob medida é prêt-à-porter, não é individual é coletiva. Afirmar que se o princípio da individualidade não for respeitado haverá prejuízo para a saúde é o mesmo que pegar as diretrizes do ACSM (Colégio Americano de Medicina Esportiva) e jogar no lixo.
O princípio da individualidade é tão importante quanto da especificidade e os outros princípios que ajudam a melhorar a performance e podem trazer benefícios para a saúde, mas não dá para dizer que porque estou usando um programa genérico minha saúde corre riscos. O ACSM disponibiliza na internet (clique aqui) suas diretrizes tanto para pessoas saudáveis quanto para grupos específicos, algumas delas já traduzidas para o português, que trazem parâmetros genéricos, para a prática saudável de atividade física.
Poderia citar também inúmeros outros sites e blogs, em português, feitos por gente séria que trazem informação de qualidade, incluindo alguns programas de treinamento. Sites bons e ruins existem em todas as áreas, busque pela palavra dieta e veja o que aparece…
Como ensinar a separar o joio do trigo? Nem tudo que cai na rede é peixe…
O que precisamos discutir são formas de educar a população para entender que nem tudo que cai na rede é peixe! Nem tudo que está na internet é confiável e no caso da Educação Física uma forma é através da escola.
Um dos objetivos da Educação Física Escolar é que o aluno tenha condições de gerenciar, apreciar e usufruir sua própria atividade, se pudéssemos fazer com que esse objetivo fosse atingido, não estaríamos preocupados com o conteúdo ruim disponível na internet, pois ele não teria penetração.
Com isso também acabaríamos com a cultura que vem se estabelecendo que só se tem qualidade e resultado com a contratação de um Personal Trainer.
Na internet não temos qualidade e fora dela temos?
O professor Luigi Guimarães não encontrou qualidade na internet e fora dela será que temos?
Minha monografia de conclusão do curso de especialização em atividade física adaptada e saúde versava sobre o conhecimento dos professores de educação física sobre obesidade e prescrição de exercícios, o resultado foi assustador. Aqui no blog, vez por outra relato experiências minhas como o da professora que viu minha patela se mexer para as laterais durante uma aula de bike ou da professora que proibiu uma aluna ativa, que treina pesado a fazer musculação porque ficou grávida. Nas academias que trabalho são inúmeras as invencionices em termos de exercícios e prescrição de suplementos por parte dos professores.
Durante minha pós-graduação tive a impressão de que faltava conhecimento básico nos alunos da turma, que na teoria tinham todos o mesmo nível, todos com graduação completa. Fato confirmado por meu orientador e coordenador do curso Luzimar Teixeira, em uma conversa informal.
Com isso a conclusão que chego é que o problema não está na internet, está na formação.
O tal professor que deveria apontar os exercícios ideais para o objetivo do aluno, sem permitir que desenvolva problemas na postura, nas articulações ou até cardíacos, conforme alertou o professor Wallace Dias, não consegue cumprir com seu papel e pior vende o Personal Trainer como uma mágica capaz de trazer resultados incríveis.
Personal Trainer garantia de qualidade, saúde e resultado. Será?
Então se a Educação Física é prêt-à-porter, para conseguirmos treinar respeitando o princípio da individualidade é necessário contratar um Personal Trainer (ou contar com um professor super ético e bonzinho que vá fazer isso por você sem faturar por fora). Até aí nada contra, também atuo como Personal Trainer e respeito a individualidade dos meus alunos.
Agora responda: um professor que cobra baratinho e por isso consegue muitos alunos, consegue respeitar a individualidade?
Vamos colocar em números absolutos: o professor cobra R$ 35,00 por aula e por isso tem 30 alunos. Imagine que metade faz aula 2x por semana e a outra metade 3x são 15 aulas por dia. Vamos ser bondosos, esse professor consegue dar todas as aulas em um mesmo local, uma academia, por exemplo. Começa às 6:00 da manhã e foi agraciado pois suas aulas acontecem de hora em hora com uma hora de pausa para o almoço, o turno termina às 22:00. Ainda tem que jantar e tomar banho, no mínimo. Quando esse professor consegue pensar na individualidade do aluno e montar um treino que garanta esse princípio. Nos fins de semana? Tenho mais de um conhecido que se gaba da quantidade de alunos que tem e se encaixam nessa descrição. Novamente o problema da qualidade extrapola as fronteiras da rede.
Onde mora o perigo?
Então será que o risco está mesmo na internet? Ou está nos profissionais que não educam de fato seus alunos? Que criam uma necessidade pelo treinamento individualizado, pensando apenas nos seus bolsos e esquecem que para promover a saúde bastam parcos 30 min de qualquer atividade física diária. Que esquecem que para a manutenção da saúde é melhor fazer qualquer atividade física do que não fazer nada.
A seriedade independe do meio que você utiliza para atingir seu público alvo. É preciso evoluir, as relações pela internet já são uma realidade, desprezá-las é ficar para trás. Se não está satisfeito com o que está por aí, faça melhor!